De pouca ressonância no Brasil, a proposta de independência de Mato Grosso, feita por militares de Corumbá e Cuiabá, em rebelião que derrubou o governo constitucional de Manoel Murtinho, teve enorme repercussão na imprensa européia. O Economist, em longo editorial, publicado em sua edição de 16 de abril de 1892, "faz considerações sobre a separação provável da maior parte dos estados que hoje formam a República do Brasil. Diz que era natural que se quebrasse a coesão que unia as províncias do antigo império, que tinha sua força no respeito geral votado à familia imperial e que só o orgulho dos brasileiros pelas vastas dimensões do seu país era talvez a única força que ainda ligava os estados da República. Não considera como muito grande a perda material causada pela separação de Mato Grosso; diz que as imensas florestas, situadas à tão grande distância do litoral, nunca poderão, nem o poderão ser tão cedo, utilizadas como fonte de riqueza, que embora esse estado possua minas minas de quase todas as espécies de minerais, as distâncias, a escassez de trabalho e a falta de meios de comunicações, fazem-nas completamente inúteis. O Brasil poderá pagar, se quiser, as suas dívidas, tanto com o Mato Grosso como sem ele, e com a sua separação trará alívio às dificuldades da autoridade central, cuja força seria mais sentida se o território sobre o qual a exerce fosse menor. Para um Estado importante como o Brasil não há talvez ônus mais enfraquecedor do que um excesso de território que não produz renda alguma, que não pode, entretanto, ser completamente negligenciado, mas que antes, pelo contrário, está sempre custando dinheiro do tesouro, com melhoramentos de vias de comunicação".
"Todavia - prossegue o articulista - a separação de Mato Grosso da União Brasileira deve ser sentida por causa das consequencias resultantes. Os estados tem poucos interesses comuns e em alguns casos, os interesses são até divergentes e opostos. Não falando das diferenças de população, os estados marítimos ressentem-se do Rio de Janeiro, e os do interior, que não têm ligação natural com a capital, só sofrem com as suas constantes revoluções. O Rio nada pode fazer para lugares tão longiquos e inacessíveis, e só faz sentir pela influência do fisco que cobra direito de trânsito sobre todas as mercadorias que para lá vão, e que está continuamente a exigir-lhes impostos, a opor-se a elevação das notabilidades locais, que, consciente ou inconscientemente, querem querem governar as suas províncias, por si, sem responsabilidade a um poder distante e moroso".
Mais adiante o editorial destaca que os "estados querem dispor das suas pequenas forças públicas, querem fazer leis que lhes convenham às suas circunstâncias e cobrar e gastar toda a sua renda do melhor modo que acharem. As suas tendências são, pois, para a autonomia, e se a República houvesse sido governada com sabedoria, ela teria com toda a probabilidade, conservado as províncias mais remotas presas por algum vínculo frouxo, mas o governo do Marechal Fonseca geriu tão mal as finanças, e aquele que lhe sucedeu mostrou-se instável, que cada uma das províncias há de, sem dúvida, ir marchando para uma independência formal, esforçando-se o Rio por manter apenas autoridade sobre as suas vizinhas imediatas".
Discorrendo sobre uma reação à eventuais atos de independência dos estados, o periódico londrino explica que o "exemplo foi dado e não há coisa alguma que torne impossível a imitação, por ser o Rio, embora o mais rico dos estados e o melhor armado, incapaz de guerras de conquistas. É possível qie consiga operar por mar contra as províncias marítimas, mas não possui nem dinheiro nem as forças para expedições, e como no caso especial de Mato Grosso, através de vastas florestas, em que um punhado de homens familiarizados com o terreno pode derrotar qualquer força armada".
Ainda no mesmo raciocínio, entende o artigo que um "grande estado europeu poderia dificilmente conservar o Brasil contra a vontade dos provincianos, e o governo do Rio não o pode certamente fazê-lo. Quando de posse de todo o Império e do poder de fazer empréstimos, conquistou dificilmente o pequeno estado de Paraguai".
É de opinião o escritor do Economist que só haverá dano para o mudo com a mudança, se algum dos nossos estados independentes restabelecer a escravidão; mas, pensa que isso não será provável, porque os negros resistirão; e como não é provável que se guerreiem entre si, hão de produzir tantos como agora. Um grande perigo seria um levante dos negros livres como estão nada terão a ganhar com uma revolta. Os Estados Unidos não permitirão que a Europa se aproveite das dissenções entre os estados, e que se confinarão a questões de limites, que se resolverão pacificamente. Os credores estrangeiros pouco sofrerão com isso, porque a sua verdadeira garantia está na renda da alfândega do Rio, e como este continuará a ser o porto de abastecimento para o interior, as suas rendas aduaneira não diminuirão.
Finaliza o editorial o jornal londrino, preconizando:
Este Estado e os seus vizinhos imediatos é provável que continuem a se chamar Brasil, e se souberem abster-se de revoluções e ter uma polícia decente, poderão ser mais ricos e mais felizes do que, quando perdidos dentro de República, que é antes uma expressão geográfica de um Estado sólido de qualquer categoria.
FONTE: Jornal do Commercio (RJ) 7 de maio de 1892.
FOTO: mapa da "República" de Mato Grosso.
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